José Andrade

As plantas rasteiras exibiam as gotas de chuva sobre as folhas num deslumbrante paetê de esmeraldas. Águas passando, levando a matança, o trem, o barco, o carro, o badalo, o caule, a flor da manhã e meu coração. Por entre a luz e a alegria daquele dia passou uma carroça levando vasos com leite e sonhos. Um menino tange o burro que puxa a carroça como quem tange a má sorte para além da Pedra do Cavalo.


O burro puxando sonhos e transportando o dia, o badalo do velho sino toca uma espécie de canção infantil para enganar os que inventaram as horas. Vi e ouvi no campanário solitário; o choro destes meninos que se desencontraram da infância, vendo-a desfazer-se em lagrimas que se estendem pela paisagem verde esmeralda até encontrar as águas soberbas do Rio Paraguaçu que separam as cidades gêmeas; São Felix e Cachoeira.



                                                                                                                            José Andrade

RESUMO
Cientes de que qualquer política de educação deverá ser compreendida na sua relação com o contexto mundial abordamos, primeiramente, a temática do homem contemporâneo e a sua nova identidade, esta surge como consequência do fenômeno da globalização, onde as grandes mudanças globais trouxeram uma nova percepção da identidade individual e coletiva. Assim, o objetivo deste artigo consiste em tecer, breves linhas, sobre a globalização e as políticas públicas no âmbito educacional, considerando a interculturalidade e a informação.
Palavras-chave: Educação. Globalização. Políticas públicas. Interculturalidade.

INTRODUÇÃO
Aquele indivíduo unificado do século XVIII passou por grandes mudanças e hoje parece ter perdido a sua identidade, a sua centralidade. Paralelamente a identidade cultural que surge no indivíduo como sentimento de pertencimento a um grupo, uma etnia, uma sociedade, um país, uma religião, apresenta as mesmas características, sobretudo no mundo ocidental.
Segundo Stuart Hall (2005, p. 11) as concepções de identidade mudaram com o transcorrer do tempo. No Iluminismo o conceito de sujeito apontava para um indivíduo centrado, unificado “dotado das capacidades de razão, de consciência e ação”. O núcleo interior do indivíduo era seu centro, emergia no momento do nascimento e se desenvolvia ao longo da vida constituindo assim a sua identidade.
Já no fim do século XIX há uma mudança na concepção de sujeito na medida em que este passa a ser compreendido como um sujeito social que interage com outros indivíduos. Nessa interação, ele interioriza os elementos da cultura na qual está inserido apropriando-se assim do desenvolvimento histórico de toda a humanidade. A identidade é formada a partir dessa interação, desse diálogo permanente entre ele e os outros. Assim, o mundo interior e o mundo exterior apresentam-se profundamente interligados e interdependentes, o que traz como conseqüência estabilidade e equilíbrio tanto para o sujeito quanto para as sociedades.
Complementando, Hall, (2005, p.32), vislumbra-se o novo homem moderno e se desenvolve paralelamente o estado, como aparato administrativo e burocrático, onde:
Este modelo sociológico interativo, com sua reciprocidade estável entre ‘interior’ e ‘exterior’, é, em grande parte, um produto da primeira metade do século XX. [...] Entretanto, exatamente no mesmo período, um quadro mais perturbado e perturbador do sujeito e da identidade estava começando a emergir dos movimentos estéticos e intelectuais associado com o surgimento do Modernismo. Encontramos, aqui, a figura do indivíduo isolado, exilado ou alienado, colocado contra o pano-de-fundo da multidão ou da metrópole anônima e impessoal.
Assim, no decorrer do século XX, perfila-se um novo indivíduo e uma nova sociedade. O surgimento dos estados capitalistas, a revolução industrial, as duas grandes guerras mundiais, as crises econômicas que afetam o mundo no decorrer do século, atingem o cerne do ser humano provocando profundas transformações individuais e sociais. Aquele indivíduo moderno do início do século, relativamente equilibrado e estável perde, de alguma forma, a sua identidade, ou melhor, ela se transforma como conseqüência dos fenômenos sociais mundiais do nosso tempo.
O sujeito, previamente vivido como tendo uma identidade unificada e estável, está se tornando fragmentado; composto não de uma única, mas de várias identidades, algumas vezes contraditórias e não resolvidas. Correspondentemente, as identidades que compunham as paisagens sociais “lá fora” e que asseguravam nossa conformidade subjetiva com as “necessidades” objetivas da cultura, estão entrando em colapso, como resultado de mudanças estruturais e institucionais. O próprio processo de identificação, através do qual nos projetamos em nossas identidades culturais, tornou-se mais provisório, variável e problemático (HALL, 2005).
Sendo assim, o sujeito contemporâneo sofre uma mudança substancial no que diz respeito a sua identidade. Ele deverá assumir, no decorrer da sua vida, diferentes identidades, em diferentes locais e respondendo ao apelo das grandes mudanças nas sociedades nas quais se insere. Ainda de acordo com Hall (2005, p. 46):
Um fenômeno importante do nosso tempo é a perda ou abandono, voluntário ou imposto, do lugar de nascimento e consequentemente da tradição, da cultura, dos costumes, do sentimento de pertencimento. Por motivos sociais, políticos ou econômicos o homem abandona seu lugar de origem e se insere em outras culturas, em outras sociedades. Assim, se fragmenta e pluraliza a sua identidade. O sujeito caracteriza-se pela sua identidade aberta, contraditória, inacabada e fragmentada.
Não só os indivíduos foram alvo de mudanças, também as sociedades sofreram o impacto dos grandes acontecimentos e a identidade cultural, tornou-se, também, fragmentada e pluralizada.
Talvez a mais importante dessas mudanças seja o fenômeno da globalização, a grande rede que intercomunica todos os seres, as comunidades, os países, as economias e o impacto que esses fenômenos têm na formação da identidade cultural dos povos, agora homogeneizada, hibridizada. Nas palavras de Stuart Hall (2005, p. 46):
No interior do discurso do consumismo global, as diferenças e as distinções culturais, que até então definiam a identidade, ficam reduzidas a uma espécie de língua franca internacional ou de moeda global, em termos das quais todas as tradições específicas e todas as diferentes identidades podem ser traduzidas.
Este autor sustenta a idéia de que afirmar que as identidades nacionais estão sendo homogeneizadas é algo muito simplista e unilateral. Para ele existem três características da globalização que devem ser tidas em conta. A primeira diz respeito a uma tendência que surge de forma paralela à homogeneização e que está relacionada à “fascinação com a diferença e com a mercantilização da etnia e da alteridade (HALL, 2005, p.77)”.
Contudo, o que a globalização busca, na verdade, são possibilidades de mercado. Para isto, visualiza pólos de consumo e desenvolve neles seus programas, tendo em vista que o global não é um substituto do local, mas uma nova forma de articulação entre ambos. A globalização criaria então, novas “identificações globais” e novas “identificações locais”.
A segunda característica tem a ver com a forma de distribuição da globalização nos diferentes países, nas diferentes culturas, dentro de cada região e nos diversos estratos da população.
Doreen Massey (apud HALL, 2005, p. 78) aponta para uma grande desigualdade neste sentido e refere-se a uma “geometria do poder”.
A terceira característica considera a globalização como um fenômeno eminentemente ocidental tendo em conta as desigualdades entre o “Ocidente” e o “Resto”. Segundo Hall (2005, p. 79):
Na última forma de globalização, são ainda as imagens, os artefatos e as identidades da modernidade ocidental, produzidos pelas indústrias culturais das sociedades ‘ocidentais’ (incluindo o Japão) que dominam as redes globais. A proliferação das escolhas de identidade é mais ampla no ‘centro’ do sistema global que nas suas periferias. Os padrões de troca cultural desigual, familiar desde as primeiras fases da globalização, continuam a existir na modernidade tardia.
Acredita-se, então, que um aspecto importante desta última característica é a grande migração ocorrida desde meados do século XX no mundo. Por causa da miséria, de lutas políticas, guerras localizadas, interesses culturais, etc., o mundo parece ter ficado pequeno e a Terra é o novo país de muitos. As fronteiras parecem ter sido derrubadas e nada nos impede de atravessá-las sem dificuldades. Assim, os países mais desenvolvidos acolhem pessoas vindas de todos os cantos.
Assim, este artigo objetiva-se a tecer, breves linhas, sobre a globalização e as políticas públicas no âmbito educacional, considerando a interculturalidade e a informação.
A metodologia adotada para o desenvolvimento da pesquisa consistiu na pesquisa bibliográfica de autores renomados que tratam da temática, com a finalidade, através da descrição dos pontos de vistas e posicionamento dos mesmos, de chegar a uma conclusão ampliada da discussão.

GLOBALIZAÇÃO, CULTURA E POLÍTICAS PÚBLICAS
A globalização do capital e tudo que tem a ver com ele influenciam os países chamados periféricos, ou países do terceiro mundo, que procuram acirradamente manter-se em condições favoráveis de competitividade e produtividade. Para isto, esforçam-se em seguir critérios universalmente aceitos e se adaptar aos padrões macroeconômicos mundiais.
Cabe aqui mencionar duas instituições internacionais que cumprem um papel fundamental na articulação deste jogo entre os diferentes países e suas economias, o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional.
O Grupo Banco Mundial surge na conferência de Bretton Woods, em 1944, na qual estavam presentes 44 países que discutiram propostas para a concepção de um novo sistema financeiro que ajudaria a fomentar o desenvolvimento e combater a pobreza. Assim, o Banco passa a financiar a reconstrução dos países envolvidos na Segunda Guerra. Sua tarefa continua até os dias de hoje; elabora projetos de desenvolvimento em seus quase 190 países membros e oferece empréstimos aos mesmos para pagar em longo prazo.
O Fundo Monetário Internacional tem como finalidade dar aconselhamento técnico, supervisão e ajuda financeira imediata aos países membros assegurando, assim, a regulação do sistema financeiro internacional.
Entre as décadas de 50 e 70 o Banco Mundial investiu na industrialização dos países do terceiro Mundo querendo, desta forma, combater a pobreza e inseri-los na economia mundial. No entanto, a pobreza e as desigualdades sociais aumentaram consideravelmente motivo pelo qual o Banco abriu investimentos na educação, na agricultura e nos setores sociais.
Na área da educação surgiram projetos importantes, alguns países elaboraram políticas educacionais semelhantes e, em muitos casos, foram copiados modelos que “deram certo” em alguns outros países. Esses modelos traziam consigo receitas e projetos de financiamento que, na maioria das vezes, mais respondiam a interesses econômicos do que educacionais.
Em relação aos projetos, o Banco não incluiu, em nenhum momento, os destinatários de seus modelos e programas na busca de soluções e na elaboração de planos de desenvolvimento. Assim, os programas foram impostos de forma hierárquica, de cima para baixo, excluindo aqueles para os quais os mesmos tinham sido elaborados. Nas palavras de Zaoual (2003, p.76):
Todas as experiências de luta contra a miséria do mundo mostra que quem detém o discurso sobre uma situação apropria-se do poder de influenciar o percurso dele e de colher os efeitos dinamizadores, tanto do ponto de vista de seu conhecimento quanto do de sua legitimidade simbólica.
O povo brasileiro, a comunidade acadêmico e os historiadores estão cientes de que uma política desta natureza só contribuiu para aumentar a pobreza na medida em que os verdadeiros envolvidos, ao serem excluídos, adotaram uma postura apática, de não participação, e os responsáveis pela elaboração dos planos, na verdade, só monopolizaram o poder. Complementando, Zaoual (2003, p. 77), afirma que este é o círculo vicioso da pobreza, onde:
A competência postulada dos especialistas e dos tomadores de decisão perpetua a incompetência dos atores do sítio onde, em outros termos, a incompetência eventual dos primeiros é substituída pela competência potencial dos segundos. Assim, estabelece-se o círculo vicioso da pobreza.
No que diz respeito à Educação, o fracasso dos primeiros modelos levou o Banco Mundial, nos anos 90, a adotar novas estratégias e novas políticas centradas no nacional, no regional, no local. Assim, de acordo com Bueno (2006, p. 92):
A descentralização passou a ser o novo lema do Banco e, nesse cenário, a educação ocupa lugar privilegiado. A estratégia é melhorar a qualidade do ensino apontando para uma maior participação dos envolvidos e admitindo que “as mudanças não podem ser impostas de fora.
Investe-se na formação de consensos e na qualidade do ensino a fim de alcançar maior desenvolvimento. Nas palavras de Sylvia Bueno (2006, p. 89):
Apresentada como estratégia chave das reformas da educação, a descentralização é associada diretamente, no início dos noventa, e até um pouco antes, à melhoria da qualidade de ensino. Todavia, críticas constantes arrefecem esse entusiasmo e seu sucesso passa a ser associado à concretização de subcategorias a ela imbricadas, tais como: participação, envolvimento, responsabilização, empoderamento.
Observa-se, contudo, da análise que investiga os efeitos da globalização sobre as políticas públicas quando relacionadas às questões educacionais como fator de interculturalidade, tem-se forte a presença das diferentes culturas sociais.
Segundo Boneti (2009), na prática do dia a dia da escola a presença das diferenças culturais e sociais, quando muito, é lembrada como objeto de estudo, no estudo das diferentes linguagens, no estudo dos diferentes costumes, modos de vida, etc. Mas a escola ainda não conseguiu ver as diferenças culturais e sociais como possibilidade de meio de ensino, como por exemplo, de se considerar verdadeiro diferentes saberes, mesmo os que são construídos fora dos muros da escola, diferentes comportamentos sociais, e diferentes condições sociais.
Na verdade, a questão do acolhimento das diferenças culturais e sociais na escola tem a ver com duas instâncias: a normatização da questão no âmbito das políticas públicas educacionais e a prática escolar do dia a dia. No que concerne à normatização, já se conta com uma política de acolhimento das diferenças culturais e sociais na escola. Mas, mesmo considerando-se que a existência do instrumento jurídico na perspectiva de se implementar uma ação já é um avanço, esta política ainda se restringe ao universo do direito, numa perspectiva do conceder, mas jamais mudar a essência do dia-a-dia da escola para que esta ação venha a ser realmente implementada. Segundo Boneti (2009, p. 162):
Esta restrição concernente às políticas educacionais recai sobre a segunda instância, a prática do dia a dia na escola. Isto faz com que entre o pessoal da escola, da pedagogia e da sociologia da educação, as diferenças culturais e sociais é sempre presente como temática de discussão, mas na verdade as regras escolares ainda não permite se considerar que as pessoas que nela chegam trazem diferenças em condições sociais e culturais, implementando uma prática escolar na qual a uniformidade cultural e social é utilizada como essência da prática do dia a dia da escola (ex. cumprimento de horário, o comportamento social, a linguagem, a dicotomização entre o certo e o errado, etc.), utiliza e produz um saber uniforme, cobra igualmente para todos o mesmo desempenho escolar.
De certa forma, entende-se que isto explica o mal estar existente na escola com a presença nela de diferentes culturas e de condição social. A pergunta que se faz e que se quer discutir neste texto é justamente esta: qual é a razão deste distanciamento entre a legislação escolar e a prática do dia-a-dia da escola no que concerne à implementação de uma ação do real acolhimento das diferenças culturais e sociais na escola?
Para responder esta questão, é importante começar analisando a essência do que move o dia a dia da escola, o que se poderia denominar de a “cultura escolar”, argumentando-se que os procedimentos burocráticos constantes nas políticas educacionais assim como o discurso utilizado no âmbito da pedagogia e da sociologia da educação não são suficientes para alterar a realidade na escola porque não tocam na essência da questão, “a cultura escolar”, sedimentada em concepções etnocêntricas advindas do racionalismo clássico.
De uma forma geral “cultura diz respeito a tudo aquilo que caracteriza a existência social de um povo ou nação, ou então de grupos no interior de uma sociedade” (SANTOS, 2003, p. 24), como é o caso da linguagem, a maneira de se vestir, a culinária, o gerenciamento das relações sociais, etc. Cultura se constitui pelas “maneiras de conceber e organizar a vida social ou aos seus aspectos materiais” (op.cit.).
Então, de que forma a cultura pode ser entendida como um conjunto de conhecimentos, de idéias e crenças que cada sociedade contém e que podem ser globalizados, através de políticas públicas inclusivas se a escola considerada como pluralismo cultural tem profundas e inúmeras desigualdades sociais? O conceito de “minoria”, dos grupos “minoritários” ou ainda dos “diferentes”, está assentado sobre a noção dicotômica do “igual”/”desigual”, a partir da ótica etnocêntrica analisada acima neste texto (BONETI, 2009).
Sob essa questão Ccastells (1999, p. 22), salienta que:
A construção noção da condição social elaborada a partir de parâmetros racionalistas e cientificistas de instâncias burocráticas do Estado se materializa, no meio social, pela construção de identidades coletivas. Ou seja, a instância burocrática do Estado determina a construção da condição social através do que este autor chama de identidade legitimadora, introduzida pelas instituições dominantes da sociedade, no intuito de expandir e racionalizar sua dominação em relação aos atores sociais.
Isto explica o fato que alguns segmentos sociais, como as classes médias e altas, utilizam os mesmos parâmetros de delimitação da condição social daqueles utilizados pelas instâncias burocráticas do Estado. Além desta “identidade legitimadora” da qual se faz referência, pode-se considerar que a utilização de critérios racionalistas e etnocêntricos por alguns segmentos sociais na delimitação da condição social igual aqueles utilizados pelas instâncias burocráticas do Estado tem origem também na construção histórica de uma racionalidade capitalista, muito própria do mundo Ocidental, que dá fundamentos a uma construção simbológica e cultural da condição social fundamentada na razão instrumental.
De acordo com Boneti (2009, p. 175):
Na prática, no meio social, existe uma mistura de imaginário e realidade na construção da noção da desigualdade normalmente envolvendo diferentes conceitos que se entrelaçam, como é o caso do da condição social com o da diferença.
De forma globalizada pensar sobre desigualdade implica pensar a condição social; pensar sobre a condição social implica pensar sobre diferença e, consequentemente, traçar políticas públicas condizentes com um processo cultural educacional inclusivo.

CONCLUSÃO
Pelo exposto, tem-se que nas questões relacionadas à globalização, as ciências sociais geralmente associam a origem desta ao mercantilismo europeu dos séculos XV e XI, quando os navegadores ibéricos enfrentaram os oceanos e conquistaram as terras de além-mar.
No cenário político, a palavra de ordem dos protagonistas liberais da globalização da economia e da atividade humana é a expansão da democracia à moda ocidental. No âmbito internacional, o local por excelência para o exercício da democracia e da cooperação política e econômica tem sido os organismos multilaterais, estabelecidos na décadas de 1940 e 1950 pelos países da comunidade internacional, sob a liderança dos países vencedores da Segunda Guerra Mundial.
Contudo, muitos são os desafios, sendo que o maior deles que se enfrenta hoje é o de fazer da globalização um instrumento efetivo de desenvolvimento humano sustentável para todos e uma oportunidade de desvendar e desenvolver as numerosas civilizações que enriquecem a humanidade. Trata-se de um desafio de enormes proporções governos nacionais, organizações da sociedade civil e agências intergovernamentais de cooperação e desenvolvimento. Aqui reside as questões relacionadas às políticas públicas.
Ressalte-se, também, que a discussão do impacto da globalização econômica e de seus protagonistas internacionais, neles incluindo os organismo intergovernamentais de cooperação e as as agências de financiamento internacional, sobre a globalização das agendas sociais vem ganhando crescentes adeptos em todo o mundo, principalmente no que concerne às questões relacionadas à educação.
A tarefa central para enfrentar o desafio de preservar nossa identidade cultural é investir permanentemente na construção de uma pedagogia latino-americana, uma pedagogia brasileira, aberta ao universal, e destinada a fortalecer nossa capacidade de participação na definição dos destinos coletivos da humanidade. Nesse sentido, os esforços de apropriação dos desenvolvimentos internacionais sobre o pensar e o fazer a educação, através da participação ativa nos organismos intergovernamentais, devem subordinar-se à consideração dos elementos formadores de nossa identidade.
Entende-se, que o objetivo desse enfoque é construir uma educação culturalmente signitificativa para educadores e educandos e politicamente efetiva para nossas comunidades, na convicção de que tal concepção pedagógica será uma contribuição original para o desenvolvimento da educação internacional e um aporte decisivo para a promoção de qualidade de vida na escola e na sociedade.
Para a consecução desse objetivo, não existem receitas acabadas ou enlatados pedagógicos no âmbito de nossas escolas e universidades. Por cima de receitas e tecnologias está o educador, está a capacidade do administrador da educação para liderar os educandos e toda a comunidade escolar na aquisição dos valores próprios de uma nova globalização, socialmente mais justa e politicamente sustentável, desenvolvendo práticas pedagógicas, formas de organização e reformas de administração, que valorizem a eqüidade e a convivência construtiva, o espírito público e a participação democrática, considerando-se estes aspectos a partir das políticas públicas traçadas.

REFERÊNCIAS
BAUMAN, Zygmunt. Globalização: as conseqüências humanas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1999.
BONETI, Lindomar Wessler. As Políticas Educacionais, a Gestão da Escola e a Exclusão Social. In: _________. Gestão da Educação: Impasses, Perspectivas e Compromissos, 3. Ed. São Paulo: Editora Cortez, 2002.

________. Etnocentrismo, cultura e políticas educacionais. Cadernos de Pesquisa. Curitiba/Paraná: UTP, 2009. p. 161-180
BUENO, M. Sylvia: Descentralização do Ensino: para além do Consenso. Interfaces entre Política e Administração da Educação: Algumas Reflexões. Marília, Fundepe Publicações, 2006.
CASTELLS, M. A Sociedade em Rede. São Paulo: Paz e Terra, 1999.
DELORS, Jacques. Educação: um tesouro a descobrir. Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI. Brasília: UNESCO, 2001.
HALL, S.: A Identidade Cultural na Pós-Modernidade. Trad. T. T. da Silva e G. L. Louro. Rio de Janeiro, DP&A Editora, 2005.
SANTOS, J. L. O que é cultura. São Paulo: Brasiliense, 2003.
SANTOS, Theotônio dos (Coord.). Os impasses da globalização: hegemonia e contra-hegemonia (v. 1). Rio de Janeiro: Ed. PUC-Rio; São Paulo: Loyola, 2003.
ZAOUAL, H.: Globalização e Diversidade Cultural. São Paulo, Cortez, 2003.



José Andrade

Era apenas uma porta, uma parede, varias paredes separando os vãos da casa, uma noite, varias noites, mas uma delas parecia feita de silencio e algodão.


Havia uma rua deserta, uma lua saltitante no céu exigente, demente da minha existência e cúmplice das aparências que não enganam.

Era apenas uma escuridão que invadia o coração ferido pela incerteza do momento que se arrastava por entre as horas escondidas no pensamento.

Havia uma porta aberta, à noite e a espera. Uma longa espera cravejada de equívocos que dançavam e cantavam insultando o sossego da sala.

Era apenas uma noite, como outra noite qualquer se a porta não tivesse sido aberta e o amor por ela se derramado e se assustado com o uivar dos cães.

Havia uma noite, uma rua, uma casa, festa na noite, gente na rua, alegria na casa. Mas tudo passou porque a porta se abriu e o amor por ela partiu.



                                                                                                                                         José Andrade

INTRODUÇÃO

A cultura é constituída pelo comportamento baseado na interação de pessoas, ou seja, o resultado da interação de grupos de trabalhos, cujos valores dominantes são apreendidos a partir da natureza dessa cultura mediante seus próprios depoimentos diretos, que são expressos em suas obras ou em declarações explícitas de seus produtores.

Segundo Eliade (1989), esse aspecto mostra que embora tenha evoluído a sociedade moderna, ainda não superou seus mitos, como proposto numa visão iluminista do progresso humano, a sociedade moderna apenas mudou os aspectos e formas de difusão dessa evolução.

Sobre esse aspecto, Munz (1997, p. 56), quando questiona sobre essa visão iluminista da humanidade, ligou essas teorias sobre cultura, em três grupos distintos: “Teorias que justificam o projeto iluminista; as teorias que vêem as culturas como fenômenos que servem determinados propósitos; e as teorias baseadas no entendimento incorreto da biologia e do darwinismo”.

Para o primeiro grupo, a cultura é entendida como um conjunto de regras em gradual mudança. Para aqueles do segundo grupo, que a concebem para atender determinados propósitos, esta é relacionada ao objetivo de viabilizar a vida humana. Esse objetivo é alcançado de formas diferentes. A terceira corrente teórica tem como base o neodarwinismo e faz a afirmação de que os seus elementos consistem em extensões dos hábitos dos primatas (MUNZ, 1997).

Da genética à questão normativa, percebe-se não existir unanimidade sobre esse tema, o que nos leva a crer, diante das afirmações dos autores supra citados, que a cultura da organização é um produto da construção social da realidade (MATURANA, 1998; MORGAN, 1996). E, ainda, deixa transparecer que a perspectiva de que essa cultura organizacional, sendo uma construção social é influenciada por muitas interações complexas entre as pessoas, situações, ações e circunstâncias gerais.

Neste cenário, as constantes transformações e os efeitos da globalização fazem com que as organizações sociais atuem vislumbrando o amanhã. Dentro desse pressuposto, a cultura constitui uma questão central para a construção do futuro, principalmente quando esta pode influenciar no processo de mudança cultural, pois que a base da cultura se assenta na antropologia cultural (FREITAS, 1991).

Anteriormente, a cultura era tida como um complexo coletivo feito de representações mentais – os indivíduos – que se ligavam do imaterial ao material (AKTOUF, 1994). Neste caso, Pettigrew (1979, p. 574 apud CAVEDON, 2003, p. 55), define cultura como:

[...] um sistema de significados que, geralmente são aceitos no âmbito público e na coletividade por um determinado grupo em um determinado espaço de tempo. Esse sistema de termos que se inclui as formas, as categorias e as imagens buscam interpretar para as pessoas as suas próprias situações.
Ou seja, a concepção é de que a partir do momento em que o homem cria cultura este é influenciado e, consequentemente, criado pela mesma, tornando-se, portanto, uma via de mão dupla. Sob esse enfoque, Tavares (1993 apud Cavedon, 2003, p. 56), refere-se à especificidade, onde afirma que: “a especificidade de cada cultura é a identidade da mesma, a marca característica de cada sociedade, legitimada e reconhecida tanto interna como externamente”.

Assim, este artigo objetiva-se a tecer, breves linhas, sobre as acepções conceituais de cultura.

A metodologia adotada para o desenvolvimento da pesquisa consistiu na pesquisa bibliográfica de autores renomados que tratam da temática, com a finalidade, através da descrição dos pontos de vistas e posicionamento dos mesmos, de chegar a uma conclusão ampliada da discussão.

ENTENDENDO A CULTURA COMO PRINCÍPIO NORTEADOR DA CONCEPÇÃO HISTÓRICA

Para Edward Tylor (1871 apud VELHO, 1999, p. 39): “Cultura é o todo complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes ou qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem enquanto membro de uma sociedade”. Entende-se que o homem é um ser predominantemente cultural.

Graças à cultura, ele superou suas limitações orgânicas. O homem conseguiu sobreviver através dos tempo com um equipamento biológico relativamente simples. Como outros exemplos citados anteriormente, têm-se que um esquimó que deseje morar num país tropical, adapta-se rapidamente, ele substitui seu iglu e seus grossos casacos por um apartamento refrigerado e roupas leves – enquanto o urso polar não pode adaptar-se fora de seu ambiente.

Complementando, Velho (1999, p. 41) afirma que: A cultura é o meio de adaptação do homem aos diferentes ambientes. Ao invés de adaptar o seu equipamento biológico, como os animais, o homem utiliza equipamentos extra-orgânicos. Por exemplo, a baleia perdeu os membros e os pêlos e adquiriu nadadeiras para se adaptar ao ambiente marítimo. Enquanto a baleia teve que transformar-se ela mesma num barco, o homem utiliza um equipamento exterior ao corpo para navegar.

Daí, a afirmativa de que a cultura é um processo acumulativo. O homem recebe conhecimentos e experiências acumulados ao longo das gerações que o antecederam e, se estas informações forem adequadas e criativamente manipuladas, permitirão inovações e invenções. Assim, estas não são os resultados da ação isolada de um gênio, mas o esforço de toda uma comunidade (MEDEIROS; ENDE, 2005).

A palavra cultura percorreu um longo caminho até adquirir um sentido sistemático de uma diversidade de maneiras de viver. Cultura é palavra de origem latina e em seu significado original está ligada às atividades agrícolas. Vem do verbo latino “colere”, que quer dizer cultivar. Pensadores romanos antigos ampliaram esse significado e a usaram para se referir ao refinamento pessoal, e isso está presente na expressão "cultura da alma". Como sinônimo de refinamento, sofisticação pessoal, educação elaborada de uma pessoa, cultura foi usada constantemente desde então e o é até hoje.

Numa nova visão de cultura, no século XIX a preocupação com a cultura se generalizou como uma questão científica; foi a partir de então que as ciências humanas passaram a tratar sistematicamente da cultura. No século XIX uma visão não-religiosa tornou-se dominante do mundo social e da vida humana. Até então o cristianismo tivera força para se impor na definição de práticas e comportamentos. A ruptura com essa visão religiosa se fez através de preocupações com o entendimento da origem e transformação da sociedade e também das espécies de vida. As preocupações sistemáticas com a cultura nasceram associadas a novas formas de conhecimento.

Mas, o termo cultura segundo, o Novo Dicionário da língua portuguesa (2000, p. 508), significa: Ato, efeito ou modo de cultivar; padrões complexos de comportamento, de crenças, de instituições e de outros valores espirituais que são transmitidos de forma material na coletividade em detrimento das características evidenciadas em uma sociedade.

Porém, no final do século XVIII e no princípio do século XIX, utilizava-se em larga escala o termo germânico Kultur com a finalidade de simbolizar todos os aspectos espirituais envolvidos em uma determinada comunidade, enquanto o conceito e entendimento que se tinha da palavra francesa Civilization se referia principalmente às realizações materiais de um povo.

Mais tarde Edward Tylor (1832-1917) sintetizou os dois termos no vocábulo inglês Culture, que passou a ter outra conotação: um amplo sentido etnográfico visando a inclusão de todo um complexo de aspectos que envolvia conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, pautados em costumes, bem como em qualquer outra capacidade, incluindo hábitos que são adquiridos pelo homem como membro de uma sociedade.
Segundo Laraia (1997, p. 25), a abrangência do termo “Culture”, definida por Tylor, relaciona-se diretamente com a possibilidade em que o ser humano tem em realizar-se, onde: Como a definição, acima apresentada, Tylor abrange em uma só palavra todas as possibilidades de realização humana, além de marcar de forma efetiva e forte o caráter que envolve o aprendizado da cultura em oposição a idéia de aquisição inata, transmitida por mecanismos biológicos.

O estudo da cultura tem sido desenvolvido levando em conta a concepção científica da cultura significativa. A cultura significativa tenta de forma clara mostrar os processos evolutivos do homem e conseqüentemente da sua cultura, no entanto, por estar atrelada ao homem, torna-se complexa, pois este tem procurado a complexidade e a tem encontrado em uma escala grandiosa, desta forma, os antropólogos buscam a ordenação desse desenvolvimento (GEERTZ, 1989).

Entretanto, como esclarece Marilena Chauí (2006, p. 105): A cultura era, assim, a intervenção deliberada e voluntária dos homens sobre a natureza de alguém para torná-la conforme aos valores de sua sociedade. Dessa perspectiva, a cultura era a moral (o sistema de mores ou de costumes de uma sociedade), a ética (a forma correta de conduta de alguém graças a modelagem de seu ethos natural pela educação) e a política (o conjunto de instituições humanas relativas ao poder e à arbitragem dos conflitos pela lei.

Nesse primeiro sentido cultura e natureza não se opõem, pelo contrário, a cultura é uma segunda natureza adquirida que se sobrepõe à natureza inata dos homens. Entretanto, já no século XVIII o termo ganha um novo sentido, cultura passa a ser o conjunto da obra humana e a relação dos homens, em sociedade com o tempo e o espaço. Cultura passa a ser sinônimo de História – os homens no tempo – e da transformação racional que eles provocam na natureza.

A cultura entendida como História passa a representar o aprimoramento e aperfeiçoamento da humanidade, até porque a própria noção de História até meados do Século XX é vinculada à idéia de progresso (CHAUÍ, 2006).Essa aproximação entre cultura, história e progresso deixa de se sustentar na segunda metade do século passado quando todo o “progresso”, todo aprimoramento advindo da obra humana foi empenhado em práticas de extermínio em massa em dois conflitos de proporções mundiais. O resultado é uma crise epistemológica que vai assolar as ciências humanas em geral, inclusive a História e a Antropologia tornando-se necessário uma nova definição do que seria a cultura e do que diferencia uma cultura de outra afastada das noções de evolução e progresso, em detrimento à perspectiva humanista.

Essa perspectiva, de acordo com Geertz (1989, p. 25), enuncia que: A perspectiva iluminista do homem era, naturalmente, a de que ele constituía uma só peça com a natureza e partilhava da uniformidade geral de composição que a ciência natural havia descoberto sob o incitamento de Bacon e a orientação de Newton.

Complementando, Geertz (1989), afirma haver uma natureza humana tão regulada e organizada, tão perfeitamente invariante e tão maravilhosamente simples como o universo criado por Newton , mesmo que as leis sejam diferentes, mas, parte da imutabilidade talvez seja obscurecida pelas armadilhas da moda local.

Assim, a cultura no contexto social, busca durante sua evolução, acompanhar as várias mudanças ocorridas em seu ambiente. Pois, como afirma o mesmo autor, Geertz (1989, p. 28): As tentativas de localizar o homem no conjunto dos seus costumes assumiram diversas direções, adotaram táticas diversas; mas, todas elas, ou virtualmente todas, agiram em termos de uma única estratégia intelectual ampla [relacionadas] à concepção ‘estratigráfica’ das relações entre fatores biológico, psicológico, social e cultural na vida humana.

Assim, como mencionado anteriormente, os fatos culturais não podiam ser interpretados contra o pano de fundo dos fatos não-culturais, entretanto, sem dissolvê-los no pano de fundo da visão antropológica, sociológica, psicológica e biológica, que numa análise cultural, geralmente, debate-se com inatas dualidades: culturalismo e relativismo, particularismo e universalismo. Daí a importância e utilidade das teorias dos princípios e das restrições nos direitos fundamentais, porque ajudam a dirimir conflitos no caso concreto.

Mas, percebe-se, contudo, que o desenvolvimento da humanidade está marcado por contatos e conflitos entre modos diferentes de organizar a vida social, de se apropriar dos recursos naturais e transformá-los, de conceber a realidade e expressá-la. A história registra as transformações porque passam as culturas, seja movida por suas forças internas, seja em conseqüência desses contatos e conflitos, mais freqüentemente por ambos os motivos. São complexas as realidades dos agrupamentos humanos e as características que os unem e diferenciam, e a cultura as expressa.

A cultura diz respeito à humanidade como um todo e ao mesmo tempo a cada um dos povos, nações, sociedades e grupos humanos. Quando se consideram as culturas particulares que existem ou existiram, logo se constata a sua grande variação. Nesse cenário, cada lógica cultural tem sua lógica interna. As variações nas formas de família, por exemplo, ou nas maneiras de habitar, de se vestir ou de distribuir os produtos do trabalho fazem sentido para os agrupamentos humanos, são resultado de sua história e relacionam-se com as condições materiais de sua existência.

Dentro desse contexto, pode-se dizer que a cultura é a esfera geral do conhecimento e das representações do vivido na sociedade histórica, tendo em vista que envolve todo o acervo de valores e hábitos que marcam a condição humana. Um conjunto de atributos que se projeta para diferentes variáveis comportamentais. Existem valores, hábitos, objetos e comportamentos genéricos que dão um certo “ar de família” cultural a uma sociedade, grupo humano, região ou comunidade.

No entanto, para Silva (2001, p. 30), as questões culturais estão relacionadas diretamente com a concepção antropológica, onde: Hoje, podemos identificar uma concepção antropológica de cultura como um conjunto de bens, utensílios, práticas, leis, normas morais, hábitos, crenças, costumes partilhados por um determinado grupo, sem a existência de um padrão comparativo que qualifique uma ou outra cultura como mais ou menos evoluída e uma concepção semiótica que deriva das contribuições que a Filosofia deu ao tema. Ou seja, que vai entender a cultura como o campo das formas simbólicas “produzidas em condições históricas determinadas”.

À luz de uma compreensão desprendida de pré conceitos, entende-se a cultura como ordem simbólica por cujo intermédio homens determinados cumprem de maneira determinada suas relações com a natureza entre si e com o poder, bem como a maneira pela qual interpretam essas relações, podendo esta ser conceituada, portanto, como sistema de relações e sentidos em um dado momento histórico.

Toda essa exposição se deve à necessidade que temos de, desde já, estabelecer que a concepção semiótica de cultura da qual será aquela adotada pelos indivíduos sociais de agora em diante. Isso porque, a cultura como conjunto de objetos, utensílios, práticas, costumes, na sua abrangência antropológica que vise fundamentar sua legitimidade, que para Silva (2001, p. 32)?

A cultura é, pois um fato a três dimensões: aos objetos físicos se conferem significações, que partem de sujeitos (seus criadores ou receptores), que entre si, por causa ou em conseqüência dessas significações, estendem uma teia de inter-relações sociais.

Tem-se, então, que criar cultura, no fundo, consiste em transformar realidades naturais ou sociais, mediante os valores impregnados na própria sociedade, que, o mesmo autor, Silva (op.cit.), complementa que dão vida aos objetos sociais, compreendidos como:
a) valores vitais, que dão origem aos modos de viver e cultivar o corpo, o bem estar;
b) valores de utilidade, que dão origem a modos de criar e fazer, surgindo daí objetos culturais: tipos de comida, habitação, objetos domésticos, vestuário, instrumentos de sua criação, utensílios e ferramentas;
c) valores espirituais: estéticos que criam objetos culturais artísticos pela pintura, escultura, arquitetura, música, dança, religião que recaem na criação de objetos culturais sagrados, compreendidos como éticos (morais, jurídicos), que delimitam o comportamento e a conduta necessários à convivência social.

É assim, que Silva (2001) ao referir-se à concepção semiótica da cultura afirma que esta não deixa de ser uma forma filosófica de conceber a cultura, que advém de vários outros conceitos até à simbologia para a compreensão constitucional da cultura que termina por enriquecer a visão semiótica que se afina com uma visão de concepção culturalista da cultura que se baseia no culturalismo jurídico, que leva em conta a contribuição maxista, que se tem na dialética do processo cultural a explicação das relações entre cultura e natureza.

À luz das diversas definições sobre cultura é que Tavares (1993, p. 72) relaciona alguns aspectos da mesma aceitos entre os antropólogos:
- a cultura é parte da biologia do homem;
- a biologia da espécie humana é produto da cultura;
- a cultura não é transmitida geneticamente, mas socialmente através da aprendizagem;
- a capacidade de aprender, desenvolver e criar cultura é transmitida hereditariamente;
- a cultura é o mecanismo adaptativo por excelência da espécie humana, responsável por sua sobrevivência, desenvolvimento e evolução;
- a cultura é socialmente produzida: embora os indivíduos sejam os portadores da cultura, tal comportamento só é possível num processo conjunto, coletivo;
- a interação com o meio ambiente, na espécie humana, é feita através do aparato cultural.

Diante dessas definições, Durhan (apud FLEURY, 1987), diz que:
Os antropólogos tenderam sempre a conceber os padrões culturais, mas não consideravam como um modelo de reprodução de condutas compreendidas como idênticas, tendo em vista que anteriormente estas eram compreendidas como as regras de um jogo.

O entendimento que se tem é de que a concepção dos padrões de cultura advém de uma estrutura que permite atribuir significado em determinadas ações em detrimento às infinitas partidas que são jogadas, tendo em vista que essa definição é considerada interessante pelo fato de colocar a cultura organizacional como um elemento chave para compreender o caráter dinâmico de uma organização, aspecto fundamental para sua sobrevivência. Sabe-se que a cultura é concebida como uma construção própria e social e relacionada com o meio ambiente. Isto é, a cultura é aprendida, transmitida, modificada e o seu processo de formação é idêntico ao dos grupos sociais em termos da criação de uma identidade grupal.

Neste sentido, para Barbosa (1996, apud CAVEDON, 2003, p. 52), os antropólogos: “tentam recuperar uma certa visão endógena do fazer em sociedade, historicamente atrelado aos conhecimentos produzidos no exterior”. Mas, apesar das conceituações apresentarem nuances e diferenças, Cavedon (2003, p. 53), afirma que:

Em um aspecto parece ter havido certo consenso entre os estudiosos, que é o de atrelar a cultura ao condicionamento dos integrantes de uma dada organização no que tange às ações e aos comportamentos socialmente aceitos pela mesma.

Anteriormente, a cultura era tida como um complexo coletivo feito de representações mentais – os indivíduos – que se ligavam do imaterial ao material (AKTOUF, 1994). Neste caso, Pettigrew (1979, p. 574 apud CAVEDON, 2003, p. 55), define cultura como:

[...] um sistema de significados que, geralmente são aceitos no âmbito público e na coletividade por um determinado grupo em um determinado espaço de tempo. Esse sistema de termos que se inclui as formas, as categorias e as imagens buscam interpretar para as pessoas as suas próprias situações.

Ou seja, a concepção é de que a partir do momento em que o homem cria cultura este é influenciado e, consequentemente, criado pela mesma, tornando-se, portanto, uma via de mão dupla. Sob esse enfoque, Tavares (1993 apud Cavedon, 2003, p. 56), refere-se à especificidade, onde afirma que: “a especificidade de cada cultura é a identidade da mesma, a marca característica de cada sociedade, legitimada e reconhecida tanto interna como externamente”.

Motta (1997); Caldas et al (1997, p. 19), relaciona a cultura nacional, enfatizando que: “os pressupostos básicos, os costumes, as crenças e os valores, incluindo os diversos artefatos que buscam caracterizar o conceito de cultura relacionado a todo um contexto social”.

Em suma, a maioria dos autores, estudiosos no assunto, afirmam que a cultura está relacionada com valores, crenças, atitudes, comportamentos que se traduzem em ações a partir do contexto antropológico evidenciado na sociedade. Contudo, de posse do entendimento que existe uma diversidade das culturas e que esta acompanha a variedade da história humana, consequentemente, expressa possibilidades de vida social organizada e registra graus e formas diferentes de domínio humano sobre a natureza.

Em termos gerais, os valores animológicos da cultura referem-se a todas as dimensões de reagibilidades, experiências vividas e conhecimentos acumulados no cérebro das pessoas. O conceito diz respeito a tudo aquilo que cada indivíduo conseguiu resguardar na mente, desde a infância até a maturidade, envolvendo um acervo particular de experiências, meditações, receios e ousadias, elucubrações, valores positivos e negativos, moralidade, espírito ético e capacidade de sublimação (CHAUÍ, 2006).

Enfim, é um "estoque" de valores e conhecimentos que se projeta em comportamentos, hábitos e reações. A história, que cria a autonomia relativa da cultura e as ilusões ideológicas quanto a esta autonomia, exprime-se também como história da cultura. E toda a história conquistadora da cultura pode ser compreendida como a história da revelação da sua insuficiência, como uma marcha para a sua auto supressão (SILVA, 2001).

Essa auto supressão adveio da diversidade cultural brasileira é repleta de significações e representações possíveis de serem percebidas, desde que os movimentos sociais ganharam as ruas, aqueles, representantes desta pluralidade, tais como as feministas, os negros, os homossexuais, a arte das favelas, a luta dos portadores de necessidades especiais, as comunidades indígenas e os quilombolas.

Toda esta diversidade ganhou as ruas porque se transformou em reivindicação, em lutas e ganhos das minorias, descaracterizando-se como movimentos particulares para lançarem-se à sociedade como um todo, à procura de reconhecimento público, mesmo que este ainda não seja sentido no concreto da vida comunitária.

Este pluralismo de idéias, comportamentos e sentimentos que estão nas ruas, distorcidamente se fazem presentes na mídia, naquela representante do pensamento liberal, que passa a idéia de que a riqueza do multiculturalismo brasileiro é plenamente absorvida por toda a sociedade, principalmente quanto as etnias, o que não é verdade.

CONCLUSÃO

Ao final dessa breve discussão acerca das acepções conceituais de cultura percebeu-se que esta, de certa forma, formata o comportamento das pessoas e é formada pelas pessoas internas, pela ética da organização, pelo seu tipo de estrutura e pelos direitos dos empregados, evoluindo e podendo ser gerenciada pelo desenho organizacional, através de algumas manifestações e práticas de processos inconscientes. E, consequentemente, a cultura influencia o comportamento social e diversifica a humanidade, apesar de sua comprovada unidade biológica, onde quanto mais ocorrem mudanças na cultura mais serão exigidas também mudanças a nível pessoal.

E, nesse contexto, pode-se inferir que a cultura não diz respeito apenas a um conjunto de práticas e concepções, como por exemplo, se poderia dizer da arte. Não é apenas uma parte da vida social, como por exemplo, se poderia falar da religião. Não se pode dizer que cultura seja algo independente da vida social, algo que nada tenha a ver com a realidade onde existe. Cultura diz respeito a todos os aspectos da vida social.

Cultura é uma construção histórica, seja como concepção, seja como dimensão do processo da vida humana. A riqueza cultural e suas relações nos fazem pensar na natureza dos todos sociais de que fazemos parte, nos fazem indagar das razões da realidade social de que partilhamos e das forças que as mantêm e as transformam. Evidencia-se, então, a necessidade de relacionar as manifestações e dimensões culturais com as diferentes classes e grupos que a constituem. Trata-se de uma incursão enriquecedora ao campo dos atributos essenciais da condição humana, no planeta vivente por excelência, que é resultado de uma concepção da política cultural.

Cada lógica cultural tem sua lógica interna. As variações nas formas de família, por exemplo, ou nas maneiras de habitar, de se vestir ou de distribuir os produtos do trabalho fazem sentido para os agrupamentos humanos, são resultado de sua história e relacionam-se com as condições materiais de sua existência, a partir de suas representações do vivido na sociedade histórica, tendo em vista que envolve todo o acervo de valores e hábitos que marcam a condição humana. Um conjunto de atributos que se projeta para diferentes variáveis comportamentais

REFERÊNCIAS

AKTOUF, Omar. O simbolismo e a cultura de empresa: dos abusos conceituais às lições empíricas. In: CHANLAT, Jean François (org.). O indivíduo nas organizações: dimensões esquecidas. São Paulo, Atlas, 1994. v.2. p.39-79.
BEYER, J. M.; TRICE, H. Studying organizations as culture through rites and ceremonials. Academy of management review. 1986.
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CAVEDON, Neusa Rolita. Antropologia para administradores. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2003.
CHAUÍ, Marilena. Cidadania Cultural: O Direito à Cultura. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2006.
FLEURY, Maria Tereza Leme; FISCHER, Rosa Maria. Estória, mitos, heróis: cultura organizacional e relações de trabalho. Revista de Administração de Empresa. São Paulo, out./dez. 1987.
FREITAS, M. E. de. Cultura: formação, tipologia e impacto. São Paulo: Makron McGraw-Hill, 1991.
GEERTZ, C. A Interpretação das Culturas. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 1989.
LAKATOS, Eva Maria. Sociologia geral. São Paulo: Atlas, 1995.
LAPLATINE, François. O que é imaginário? Col. Primeiros Passos. São Paulo: Brasiliense, 1995.
LARAIA, R. de B. Cultura: um conceito antropológico. Rio de Janeiro: Zahar, 1997.
MOTTA, Fernando C. Prestes. Cultura e organizações no Brasil. In: MOTTA, Fernando C. Prestes e CALDAS, Miguel. (org) Cultura organizacional e cultura brasileira. São Paulo: Atlas, 1997
SILVA, José Afonso da. Ordenação Constitucional da Cultura. São Paulo: Malheiros, 2001.
TAVARES, Maria das Graças de Pinho. Cultura: uma abordagem Antropológica da Mudança. Rio de Janeiro: Qualitymark, 1993.
VELHO, Gilberto. Individualismo e cultura: notas para uma antropologia da sociedade contemporânea. 5. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,






José Andrade

Segunda-feira, 30 de novembro, quando fiquei sabendo do falecimento de Luciano Camacam fiquei perplexo, atônito, procurei na escuridão da noite um ponto firme, concreto, onde pudesse fixar meu olhar e encontrei apenas o abstrato do fato e da ausência. Mas neste caso, a ausência não é falta, é presença de quem partiu, mas vivo está porque viverá em nossos corações.
Em circunstancias assim como essa, parece que a gente entra numa sala de cinema e de repente, começa a serem projetadas na telona as cenas dos momentos vividos na companhia da pessoa que morreu. Foi assim que me lembrei de Luciano, ainda no primeiro semestre do curso de jornalismo na Faculdade da Cidade do Salvador. Ele demonstrava ser um obstinado pelo texto jornalístico de boa qualidade. Cuidadoso e curioso como era, logo descobriu o seu lugar no amplo terreno da atividade jornalística; fazer jornalismo na televisão. Eis a sua aspiração profissional! Atualmente ele pode apalpar este sonho trabalhando na produção do Programa da Mira na TV Aratu.
A vida mudou e tivemos que seguir caminhos diferentes; eu estudando no turno matutino e Camacam no turno noturno. Passei a vê-lo esporadicamente e quase não nos falávamos. Voltei a encontrá-lo na semana em que nos preparávamos para apresentar nosso trabalho de conclusão de curso. Ele continuava o mesmo; cheio de projetos e empreendimentos. Era uma pessoa que sabia o que queria, sabia lutar pelo que queria. Ele estava convencido da sua vocação. Parecia cada vez mais determinado, corajoso, valente, desafiador. Era assim Luciano; desafiava os obstáculos, o perigo e o medo. No entanto, naquele dia, percebir que dentro dele algo havia mudado. Sutilmente, delicadamente, aquele menino rebelde de outrora, estava se tornando não apenas um jornalista de primeira grandeza, mais também um rapaz sensato, cuidadoso e amoroso com as palavras e as pessoas. Deus já estava lhe preparando para se despedir deste mundo.
Recebi uma ligação dele no dia 10 de outubro, dizendo que queria falar comigo pessoalmente. No momento em que recebi o telefonema eu estava impossibilitado de atendê-lo por me encontrar em Campos do Jordão-SP. O que será que o meu amigo tinha de tão importante para me dizer? Nunca vou saber.Seria eu para ele uma metáfora de alguém que pudesse lhe escutar? Creio que sim! Ele hoje foi para o céu conversar com Jesus Cristo, seu amigo fiel de todas as horas que lhe escuta e abre para ele as portas do paraiso. O Bom Pastor está a lhe dizer neste momento: Venha filho querido do meu pai, habitar nesta paz que por te foi desejada. Venha habitar na morada que um dia foi preparada para você. Quem conviveu com Luciano Camacam, não poderá esquecer o brilho dos seus olhos. “Olhos são palavras,” disse o poeta Pablo Neruda. Os olhos de Luciano são sorrisos. Ele sorria com os olhos. É assim que ele está diante de Deus; sorrindo com os olhos e Deus sorrindo para ele. Nós também olhamos sorrindo para o céu e agradecemos ao Deus da vida por Ele ter permitido que Camacam viesse a este mundo para nos ensinar que na vida vence quem persevera, quem enfrenta o dia-a-dia com otimismo e força de vontade. Começar uma caminhada não é tarefa difícil, difícil mesmo é chegar onde se pretende chegar. Para quem está perdido qualquer caminho é caminho, mas Luciano sempre sobe qual era o seu caminho. Ele sabia onde queria chegar. Hoje ele chegou onde sempre quis estar e o Pai do Céu o acolheu, cobriu-lhe o rosto de beijos e  deu-lhe a  plenitude da vida.
Dê um abraço em Deus Luciano, diga a Ele que estamos todos com saudade de você. Nós, seus amigos que aqui ficamos, vamos fazer bonito, vamos cumprir nossa missão para honrar a lição que você nos deixou. Um dia estaremos onde você está agora,  já estamos caminhando ao teu encontro. Chegaremos aos pouquinhos; um á um, até que um dia estaremos todos juntos gozando da perpétua alegria de um convívio celeste.
Até breve!










Um poema de José Andrade para o jornalista Nelson Francisco ( in memoriam)


Minha esperança corre veloz no asfalto molhado pelo pranto da manhã. Vai apressada, ultrapassando o passado, que passa deslizando pelas ruas da cidade, quase acordada do pesadelo da noite. Ela navega pelo Rio Cuiabá, cujas águas cortam a cidade com a mesma doçura do teu afeto. Sobrevoa os confins do céu e não te encontra. Onde estarás agora, além deste lugar onde te falo, imaginando-te me ouvir, já que agora a tua vida é vida imaginada?
Procuro-te pelos quatro cantos da cidade que em mim evocava o teu nome, e encontro apenas vestígios de tua ausência. No lugar onde exististe desde que de mim partiste, nada, a não ser a menção ao teu nome, evoca-te com brandura. Caminhei repleto do silêncio da madrugada e coberto pela escuridão da noite. Em vão, vou caminhando pelos vãos da minha memória até encontrar-te, pois nela viverás enquanto meus dias forem uns simples viveres. Procuro-te deste sempre e tu bens sabes o quanto fiz, apesar de nada fazer para evitar o abismo que se instalou entre nós dois.
A nossa promessa é juramento cumprido, testemunhado pelo dia que se apaga, lamentando o desalento que se abateu sobre meu peito, dilacerado pelo último raio do sol, quando em meu coração se extinguiu a última esperança. Cheguei a tua porta, quando tinhas partido para sempre, sem ter tido tempo de me esperar. Por que não me esperaste, já que faltava tão pouco? Tu disseste, mais de uma vez, que o dia do nosso reencontro iria ficar na história, haveria de ser um dia de muita alegria. Como se explica, então, a tortura do nosso desencontro? A amargura da tua ausência inunda a hora da minha morte, pois quando morre um amigo, morremos juntos com ele.
Hoje é o dia do nosso reencontro. Não foi como quiseste e nem como eu desejei. Apenas foi. Poderia ter sido de forma diferente, bem que podia. Bem que eu queria, mas não foi. Caminho agora pelas ruas palmilhadas pelos teus pés, escutando o eco da tua voz, apresentando-me a cidade, cenário de tua vida. Há quem me diga que, aqui, foste feliz e tiveste muitos amigos, conquistaste o respeito e admiração dos cidadãos desta região. Tu, que foste admirador de minhas palavras e conservaste muitas dela no teu coração, não as deixes agora perdidas no mundo sem te encontrarem. Por que não me esperaste e me deixaste perdido, aflito, vazio de mim e de ti?
Faltava tão pouco...