Um poema de José Andrade para o jornalista Nelson Francisco ( in memoriam)


Minha esperança corre veloz no asfalto molhado pelo pranto da manhã. Vai apressada, ultrapassando o passado, que passa deslizando pelas ruas da cidade, quase acordada do pesadelo da noite. Ela navega pelo Rio Cuiabá, cujas águas cortam a cidade com a mesma doçura do teu afeto. Sobrevoa os confins do céu e não te encontra. Onde estarás agora, além deste lugar onde te falo, imaginando-te me ouvir, já que agora a tua vida é vida imaginada?
Procuro-te pelos quatro cantos da cidade que em mim evocava o teu nome, e encontro apenas vestígios de tua ausência. No lugar onde exististe desde que de mim partiste, nada, a não ser a menção ao teu nome, evoca-te com brandura. Caminhei repleto do silêncio da madrugada e coberto pela escuridão da noite. Em vão, vou caminhando pelos vãos da minha memória até encontrar-te, pois nela viverás enquanto meus dias forem uns simples viveres. Procuro-te deste sempre e tu bens sabes o quanto fiz, apesar de nada fazer para evitar o abismo que se instalou entre nós dois.
A nossa promessa é juramento cumprido, testemunhado pelo dia que se apaga, lamentando o desalento que se abateu sobre meu peito, dilacerado pelo último raio do sol, quando em meu coração se extinguiu a última esperança. Cheguei a tua porta, quando tinhas partido para sempre, sem ter tido tempo de me esperar. Por que não me esperaste, já que faltava tão pouco? Tu disseste, mais de uma vez, que o dia do nosso reencontro iria ficar na história, haveria de ser um dia de muita alegria. Como se explica, então, a tortura do nosso desencontro? A amargura da tua ausência inunda a hora da minha morte, pois quando morre um amigo, morremos juntos com ele.
Hoje é o dia do nosso reencontro. Não foi como quiseste e nem como eu desejei. Apenas foi. Poderia ter sido de forma diferente, bem que podia. Bem que eu queria, mas não foi. Caminho agora pelas ruas palmilhadas pelos teus pés, escutando o eco da tua voz, apresentando-me a cidade, cenário de tua vida. Há quem me diga que, aqui, foste feliz e tiveste muitos amigos, conquistaste o respeito e admiração dos cidadãos desta região. Tu, que foste admirador de minhas palavras e conservaste muitas dela no teu coração, não as deixes agora perdidas no mundo sem te encontrarem. Por que não me esperaste e me deixaste perdido, aflito, vazio de mim e de ti?
Faltava tão pouco...